Chegando em um dos prédios onde o meu filho faz terapia, meu olhar encontrou o de um pai que estava na recepção, pronto para subir.
O pai segurava a mão do filho de mais ou menos 5 anos, antecipava a espera, dizia que logo ele iria brincar, claramente pisava em ovos para não desencadear uma crise.
A gente sabe. Eu acredito que há algo em nós, pais e mães atípicos, que só é visto na gente. Invisível aos outros, mas totalmente perceptível ao nosso grupo que foi selecionado a dedo pelo universo.
Você já parou para sentir?
O olhar ansioso do outro? O medo do futuro que você sente? Eu sinto também.
Aquela reação desconcertada quando a criança faz algo socialmente inaceitável? O misto da culpa com a serenidade de saber que a criança faz não por que é mal educada e sim por que é autista? Aqueles feedbacks dos profissionais quando a gente não está com a cabeça no lugar para entender o que está sendo dito? Eu sei. Vivo nas recepções das clínicas. Tenho amigas mães atípicas. A gente observa. Sente. Assente.
A gente se enxerga no desconforto do outro.
O turbilhão vai crescendo como uma nuvem de fumaça ao mesmo tempo que a mãe e o pai vão diminuindo de tamanho .O chão vai desaparecendo sob os nossos pés.
Tem alguém aí?
Alguém sabe que eu visto os meus calçados já no elevador por que eu pareço viver atrasada para os nossos compromissos matinais?
Alguém sabe quanto tempo levo de uma terapia à outra num dia chuvoso?
Alguém sabe quem eu era antes dessa rotina maluca? A vida que eu levava?
Às vezes nem eu sei quem eu era antes disso tudo.
Seria quase a frase adaptada para "família atípica é tudo igual, só muda de endereço"? Hmm não sei.
Se você estiver se sentindo exausta ou exausto hoje, eu te vejo.
Eu entendo que as coisas por aí possam estar num momento mais difícil.
Que a criança pode estar demandando algo que no momento você nem sabe se tem para dar.
Paciência.
Tempo.
Disposição.
Eu te abraço com os olhos.
E te digo que logo as coisas melhoram.
Nada como um sorriso dos nossos filhos para lembrar que tudo, de bom e não tão bom, vale a pena.
Texto escrito por Shadya Hamad em 14.06.23
Arte: Canva